Aracaju,
7 de dezembro de 2015.
Senhoras e senhores:
Na minha recente visita à Cidade Maravilhosa
(Rio de Janeiro), na fantástica Avenida Rio Branco, entro numa vasta livraria.
Quis o acaso que eu me aproximasse de uma
prateleira que atraiu o meu olhar.
Observo o dorso de um livro volumoso,
intitulado 100 Discursos Históricos, organizado por Carlos Figueiredo, Editora
Leitura.
Comprei-o imediatamente.
Li esse livro vagarosamente.
Por incrível que pareça, os discursos que mais
me causaram forte impressão foram de autoria de dois caciques de tribos dos
Estados Unidos.
Transcrevo o discurso do cacique Seatle, o qual
nos transmite uma aula emocionante da mais bela literatura.
Edson Valadares
CACIQUE
SEATLE
(1865)
Em 1854,
o governo dos Estados Unidos quis comprar as terras do chefe indígena Seatle.
Sua
resposta, transmitida ao presidente por carta, é a fala de um mundo ancestral e
anímico.
Sua
importância cresceu com o tempo, a partir da ampliação da consciência
ecológica. É hoje uma peça famosíssima, distribuída pelo Programa de Meio
Ambiente da ONU.
“O presidente declarou em Washington que deseja
comprar a nossa terra. Mas como se há de comprar ou vender o céu, a terra? Tal
ideia é estranha para nós. Se não possuímos a presença do ar, e o brilho da
água, como se há de comprá-los? Cada pedaço desta terra é sagrado para o meu
povo. Cada agulha reluzente de pinheiro. Cada praia arenosa. Cada campina. Cada
inseto que zumbe. Tudo isso é sagrado na memória e na experiência do meu povo. Conhecemos
a seiva que corre pelas nossas árvores tal qual conhecemos o sangue que corre
pelas nossas veias. Somos parte da terra, e ela é parte de nós. As flores
perfumadas são nossas irmãs. O urso, o gamo, a grande águia, são nossos irmãos.
Os picos rochosos, as essências do prado, o calor do corpo do pônei e o homem,
todos pertencem à mesma família. A água brilhante que se escoa nos ribeiros e
nos rios não é somente água, mas o sangue dos nossos ancestrais. Se lhe
vendermos a nossa terra, você terá de lembrar-se de que ela é sagrada. Cada
reflexo que como um fantasma, aparece na límpida água dos lagos, fala de
acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz
do pai do meu pai. Os rios são nossos irmãos. Eles aplacam nossa sede,
transportam nossas canoas e alimentam nossos filhos. Por isso você deve ter
para com os rios a benevolência que teria com qualquer irmão. Se lhe vendermos
a nossa terra, lembre-se de que o ar é precioso. Lembre-se de que o ar
compartilha seu espírito com toda a vida que ele sustenta. O vento que deu ao
nosso avô seu primeiro alento recebe também seu último suspiro. O vento dá aos
nossos filhos o espírito da vida. Por isso, se lhe vendermos a nossa terra,
você precisa mantê-la à parte, como algo sagrado, como um lugar aonde um homem
pode ir expor-se ao vento que é perfumado pelas flores do prado. Ensinará você
aos seus filhos o que nós ensinamos aos nossos filhos, que a terra é nossa mãe?
O que acontece à terra acontece aos filhos da terra. Isso nós sabemos. A terra
não pertence ao homem. O homem pertence a terra. Todas as coisas estão ligadas,
como o sangue, que nos une a todos. O homem não tece a teia da vida; nela, ele
é apenas um fio. O que ele faz para a teia, fá-lo para si mesmo. Uma coisa nós
sabemos: nosso Deus é também o seu Deus. A terra lhe é preciosa. E danificar a
terra é desprezar o seu criador. O destino de vocês é um mistério para nós. Que
acontecerá quando os búfalos tiverem sido mortos? Os cavalos selvagens domados?
Que acontecerá quando todos os cantos secretos da floresta estiverem
impregnados do cheiro de muitos homens, e a vista das sazonadas colinas estiver
escondida pelos fios que falam? Onde estará a brenha? Desapareceu. Onde estará
a águia? Desapareceu. E o que é dizer adeus ao pônei veloz e à caça, o fim do
viver e o começo do sobreviver? Quando o último pele-vermelha tiver
desaparecido com sua selva, e sua lembrança for apenas sombra de uma nuvem
movendo-se por sobre a pradaria, ainda estarão aqui estas praias e estas
florestas? Restará ainda algo do espírito do meu povo? Nós amamos esta terra
tal como o recém-nascido ama as batidas do coração de sua mãe. Por isso, se lhe
vendermos a nossa terra, ame-a como nós a temos amado. Preocupe-se com ela como
nós nos temos preocupado. Tenha em mente a lembrança da terra tal como ela for
quando você a receber. Preserve a terra para todas as crianças e ame-a como
Deus ama a todos nós. Assim como nós somos parte da terra, também você é parte
da terra. Esta terra é preciosa para nós e também para você. Uma coisa nós
sabemos: só há um Deus. Nenhum homem, seja ele pele-vermelha ou branco, pode
viver isolado. Afinal, somos todos irmãos.”
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