______UM SERTANEJO NO CANADÁ__________
Eu concluía os
trabalhos de auditoria na filial da Trading-Company brasileira da cidade de
Hamburgo, Alemanha.
O frio
permanente de 10º abaixo de zero e a visão de uma eterna toalha branca de neve
que cobria a cidade, davam-me saudade do calor do Rio de Janeiro e já me
regozijava pelo momento da minha viagem de volta ao lar.
Eis que recebi
instruções para voar para Toronto (Canadá), com a missão de auditar as
operações financeiras e contábeis da filial.
O meu espírito
enevoou-se. Conhecer o Canadá apresentava-se como um sonho. Entretanto, era
inverno e eu tinha conhecimento de que o país era um dos mais frios do mundo. A
temperatura atingia até 60º abaixo de zero nas regiões mais frias.
Contudo, o
desejo de conhecer o mais moderno e um dos mais ricos
países do mundo me fez esquecer a ameaça do tempo.
De Hamburgo fui
para Frankfurt.
Num voo da
Lufthansa, que demorou dez horas, transportei-me para o Canadá.
A viagem não foi
cansativa, pois o pessoal de bordo tratava os passageiros com o carinho de uma
babá e oferecia bebidas desejadas pelos deuses.
Ao penetrar no
território desse país gigantesco, o enorme pássaro branco baixou as asas e
passou a voar a baixa altura. A boa visibilidade me permitia vigiar das alturas
as regiões atravessadas. Voamos cerca de 2.000 quilômetros e eu notava que a
paisagem branca, por causa da neve, era uniforme. A visão dava ao observador a
impressão de que o país estava coberto por fantástico lençol de gelo.
Descemos no
moderno aeroporto de Toronto. O meu coração batia forte, emocionado. Eu tinha a
impressão que sonhava.
O Canadá não
exigia visto de entrada para brasileiros.
Fui conduzido ao
setor de emigração. Atendeu-me um senhor de nacionalidade portuguesa que
teimava em interrogar-me em português. O seu sotaque me pareceu horrível, quase
incompreensível. Eu teria preferido que ele falasse inglês, francês ou
espanhol.
Perguntou-me
logo o motivo da minha entrada no Canadá. Disse-lhe que era auditor e tinha por
missão fazer trabalhos de fiscalização na filial de uma empresa brasileira
situada em Toronto. O português não gostou da minha cara e fazia um inquérito
minucioso. A entrevista se alongava. Eu me imaginava um brasileiro em processo
pela inquisição.
Aquele
interrogatório me parecia uma provocação.
Exasperado,
respondi: “senhor, eu não pretendo morar no Canadá, este país que me parece uma
geleira. Eu amo o meu país, o Brasil. Eis aqui a minha passagem de regresso ao
Rio de Janeiro”. Por último, o zeloso e antipático “patrício” perguntou-me
quantos dólares eu portava. Mostrei-lhe os meus cheques-de-viagem e o sujeito
carimbou o meu passaporte.
Aliviado, tomei
um táxi e fui para o hotel de antemão reservado.
Preenchi uma
ficha sem muitas perguntas, apanhei a chave do apartamento designado, caí na
cama e dormi quieto como um urso em sua toca em estado de hibernação.
O dia amanheceu.
Tomei um banho quente e desci para tomar o café. O hotel ficava perto do
“shopping” em cujo interior estava instalado o escritório da filial. Decidi-me
a chegar lá caminhando. Não nevava naquela manhã. O céu sem nuvens mostrava,
orgulhoso, a sua cor azul. O sol brilhava forte, como no Rio de Janeiro.
Mas, uma
surpresa me aguardava.
Na porta do
“hall” do hotel havia um barômetro. Aproximei-me e fiquei espantado. Marcava
30º abaixo de zero. Dirigi-me à portaria e perguntei se o aparelho estaria com
defeito, pois o sol brilhava com intensidade, não nevava e o céu limpo estava
como um espelho.
O homem
compreendeu logo que eu era estrangeiro.
Surpreendeu-se
com a minha pergunta e me deu esta explicação.
Disse: “o
frio é justamente mais intenso quando não há nuvens para reduzir os seus
efeitos”.
Voltei ao
apartamento e vesti todas as roupas de frio que levava na mala, inclusive uma
máscara protetora do rosto que havia comprado na Alemanha.
Vestido como um
esquimó sai à rua levando um mapa da cidade. Nas praças, centenas de crianças
robustas, vestidas de roupas coloridas, patinavam alegremente.
Andei quase um
quilômetro e, de repente, visualizei um prédio de 70 andares que eu sabia anexo
ao segundo maior “shopping” do mundo. É suficiente dizer que no seu bojo havia
60 restaurantes! A calefação era perfeita e eu me desfiz da roupa de frio, ali
desnecessária.
E agora, aonde
ficava a sede da filial? Recordei-me da minha infância quando praticava o
conhecido jogo de “quebra-cabeça”.
Após perguntar muito cheguei ao endereço
desejado.
Apresentei-me ao
diretor e iniciei as minhas tarefas, agora com maior experiência internacional.
O método de
escrituração contábil estava perfeito; obedecia aos parâmetros teóricos e práticos
do meu conhecimento. Felicitei o Contador canadense e elogiei-o no meu
relatório, um procedimento único na minha vida como auditor.
Para a minha
satisfação, o colega elogiou o meu inglês, embora me ensinasse a pronúncia
canadense de algumas palavras.
A minha demora
em Toronto foi de 20 dias.
Os meus
percalços nessa cidade, inerentes a sujeito curioso, foram poucos. Citarei
alguns.
Lembro-me que
num domingo entrei num bonde sem saber o seu destino. A viagem demorou mais ou
menos uma hora. No final do trajeto todos os passageiros desceram desse
estranho meio de transporte já extinto no Brasil. Eu permanecia sentado. O
condutor me achando uma ave fora do ninho aproximou-se e perguntou em inglês
que me parecia alemão, por que eu permanecia no bonde. Disse-lhe ser brasileiro
e estava a passeio, sem destino. Perguntei-lhe se ia regressar ao Centro da
cidade. Entendi ele dizer que demoraria meia-hora. Caia neve e o frio cortava o
meu corpo como uma faca.
Embora temendo
não haver compreendido bem a informação do condutor, resolvi esperar.
O homem voltou,
para a minha alegria.
O bonde
movimentou-se e eu me senti feliz quando reconheci o lugar onde deveria descer.
Acenei para o condutor que me respondeu com um sorriso.
E então voltei
para o hotel sem desejo de nova aventura naquele dia congelado.
Na véspera de
minha partida para o Brasil desejei visitar um museu famoso que ficava a uns
500 metros do “meu” “shopping”. Lá fora fazia mais de 30°c abaixo de zero.
Confiando na montanha de roupas contra o frio que usava, dirigi-me ao museu.
Andei uns 100
metros. O frio era intenso como o de um “freezer”. Eu estremecia como um doente
de malária. As orelhas, duras como pedra. Esfregava-as com violência, temendo
que se quebrassem como vidro.
Resolvi sustar a
visita e voltei ao “shopping” correndo como
uma lebre.
Acho que devo
dizer mais algumas palavras a respeito das visões que mais me impressionaram em
Toronto, a mais populosa cidade do Canadá.
Existe ali um
famoso zoológico, fechado aos visitantes no inverno.
Em Toronto
levanta-se a mais alta torre do mundo 500 metros. No seu topo pousa um
restaurante. Sobe-se de elevador sem parada intermediária. Tive receio de dano à
minha pressão arterial e limitei-me a observar de longe aquela Torre de Babel.
O guia informava
ser o prédio da Prefeitura de Toronto o mais moderno e mais bonito do mundo.
Visitei-o e acho que o guia não mente.
Num dia qualquer
eu passeava pelas ruas do Centro da cidade, sem rumo certo. Chovia neve, sem
cessar. Na esquina da rua muito larga que eu percorria, estanquei à frente de
um edifício de beleza fantástica. Era todo de vidro cor- de rosa. No topo eu
lia: Banco da Nova Escócia, em inglês. Apesar do bombardeio da neve permaneci
ali uns 20 minutos, “namorando” aquele produto do gênio humano.
Não vi favela em
Toronto. Não vi pobres ou miseráveis.
O Canadá é uma
nação de homens robustos como pau-d’arco.
Eu me lembrava
da minha juventude quando via no cinema a famosa cavalaria montada do Canadá.
Os militares
pareciam gigantes saídos das páginas dos contos de fada. Eu duvidava. Pensava
ser erro de visão, e agora eu tinha a oportunidade de esclarecer a dúvida. Era
verdade. Os homens da cavalaria montada canadense são enormes e elegantes em
suas fardas vermelhas. Os grandes e belos cavalos seriam da mesma raça do lendário
PÉGASO.
Impressionou-me,
outrossim, o palácio do governador inglês (hoje museu), construído no centro de
uma praça bonita, creio que no ano recuado de 1630. O imponente edifício, de
tijolos vermelhos, parecia ter sido inaugurado ontem. Num devaneio, eu
imaginava que a qualquer momento ouviria o toque de clarins para anunciar a
chegada ou a saída do governador, do seu palácio, que na hora da minha visita
estava fechado.
Devo dizer,
finalmente, que a arquitetura do Canadá, na minha visão de leigo na matéria,
pareceu-me mais
moderna e funcional do que a de Nova York ou Washington.
Tive a
oportunidade de observar outras maravilhas
que não são para serem relatadas, mas para
serem vistas.
Durante a minha
estada nesse país rico, fabuloso, civilizado, infelizmente congelado no
inverno, senti saudade do clima e do sol do meu sertão, principalmente quando a
temperatura atingia 40° acima de zero.
Ao pisar
novamente o solo do meu país beijei o chão, imitando o PAPA. Senti-me feliz e
orgulhoso de ser brasileiro!
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