quarta-feira, 8 de junho de 2016

UM SERTANEJO EM NOVA YORK



­­­     UM SERTANEJO EM NOVA YORK________   







Parece fantasia a notícia de que um menino sertanejo tivesse um dia visitado Nova York.
A admiração pelo feito cresce de importância porque a viagem realizada àquela admirável cidade, símbolo da grandeza dos Estados Unidos da América do Norte, não foi de turismo. O sertanejo tabaréu esteve por duas vezes na capital financeira do mundo, como auditor, tendo por missão fiscalizar as operações financeiras de uma importante Trading- Company brasileira.
Era inverno nos EE. UU..
Recebi instruções para viajar a Nova York a fim de auditar as contas da filial ali sediada.
Enquanto providenciava passaporte, visto de entrada naquele país e outros detalhes, comprei um guia turístico e estudei a contabilidade norte-americana, dia e noite. Repassei os conhecimentos de inglês que se apagavam da memória. A história e a geografia daquele gigante eu conhecia satisfatoriamente, pois fui sempre estudioso dessas matérias, mas por curiosidade do que por necessidade.
Afinal chegou o grande dia.
Entrei num avião da Varig e após nove horas de vôo eu me achava no enorme aeroporto Presidente Kennedy. Registro um tremendo susto quando já sobrevoava o território norte-americano. Penetrando num vácuo o avião “caiu” uns dois quilômetros e eu temi a morte. Os passageiros se olhavam mostrando o pavor estampado nos rostos.
Pisando o solo de Nova York, o meu coração, tomado de emoção, me ameaçava de enfarte.
Entrei num espaçoso taxi amarelo; forneci ao motorista o nome e o endereço do hotel que ficava na 3ª avenida. Ao chegar ao
destino o mal-humorado “driver”                  cobrou-me
US$ 40,00.Foi um roubo. Tardiamente vim a saber que o preço correto era US$ 20,00. O episódio me alertou contra outros roubos futuros.
O escritório da filial ficava perto do hotel. As ruas numeradas facilitavam a minha orientação. É impossível que alguém com juízo se perca em Nova York.
Na segunda-feira, pela manhã, compareci à filial. Apresentei-me ao diretor-financeiro, o qual me levou à sala do “controller”, responsável também pelo Departamento de Contabilidade, como é de praxe no país.
O chefe deste Departamento era um sorridente e simpático chileno, economista, ele próprio responsável pela escrituração dos livros contábeis, nas “horas vagas”. O tempo dele era empregado, em sua maior parte, com assuntos financeiros. Os

serviços contábeis estavam atrasados; a escrituração precária. O chileno nunca tinha tempo disponível para me prestar informações. Após uma semana de auditagem tive a certeza de que a contabilidade estava à matroca.
Redigi, então, meu primeiro relatório para a Matriz e ofereci críticas severas ao sistema contábil da filial, indicando imperfeições e os erros encontrados. O arquivo dos documentos parecia um museu abandonado.
Dei cópia do relatório, como era de praxe, ao diretor financeiro, a quem o“controller” estava subordinado.
Entrementes, me dirigi ao “controller” para solicitar esclarecimentos a respeito de lançamentos contábeis, para reclamar do atraso da escrituração e da ausência do seu responsável, o chileno.
E dessa entrevista percebi que o contador
 americano, judeu, não supervisionava a contabilidade.


O sujeito era pernóstico e intratável. Julgava-se um KESTER, o maior contador do mundo. Pensava ele, sem dúvida, que um contador de país conhecido como de 3º mundo fosse um idiota.
Ao invés de me prestar os esclarecimentos solicitados, o indivíduo mostrava-se soberbo e mostrava na face as rugas da indignação. Para humilhar-me, disse em voz alta: “eu sou Contador P.H.D.”. Caprichando na pronúncia das palavras inglesas, perguntei-lhe: “em quantas línguas o senhor estudou contabilidade? ” Respondeu: “só falo inglês. ” Muito bem contador P.H.D., eu estudei contabilidade em quatro línguas. Não sou P.H.D. como o senhor, pois não temos esse curso no Brasil, entretanto vejo que sua contabilidade é “shit” {merda}. E retirei-me.
O diretor já havia informado a ele o teor do meu relatório.
Após a citada entrevista, o sujeito foi ao diretor fazer “fofoca”.

Ele era brasileiro há muitos anos radicados nos EE. UU.. Extremamente simpático e educado.
Mandou chamar-me e fez um longo arrodeio antes de me dizer o que desejava. Em certo momento, disse: “o nosso “controller” pode não ser o mais competente contador dos Estados Unidos, mas é P.H.D. e um profissional de valor”. Eu pressenti que ele me chamava á atenção, de uma forma discreta e cavalheiresca.
Eu me queixei da recusa do seu auxiliar em esclarecer as minhas dúvidas; que a contabilidade era malfeita e atrasada e mais ainda que o economista chileno nunca tinha tempo disponível para conversar comigo. A entrevista terminou aí. Pedi licença e me retirei prometendo um novo relatório que já estava redigido. Nesse segundo documento critiquei duramente os serviços contábeis e o “controller” responsável.
Demorei nessa auditoria, quase dois meses. Escrevi muitos relatórios que somaram umas 200 páginas.
Telefonei para o Presidente pedindo permissão para regressar ao Brasil, pois considerava desnecessária minha permanência em Nova York.
Antes da viagem tive a informação da demissão do “controller” P.H.D. que tentou me humilhar com seu pomposo título. E assim, um filho do sertão retirou do seu “trono” um contador P.H.D., nos EE. UU..
Ainda demorei-me em Nova York, já agora numa missão mais agradável: TURISMO.
Nu sábado ou domingo eu tomei uma rua que levava ao HARLEM.
Na fronteira desse bairro violento, de fama mundial, perguntei ao jornaleiro se aquela hora {meio-dia} eu poderia visitar o HARLEM sem risco de vida. Ele respondeu que não me aconselhava essa aventura.
Indiferente ao perigo, resolvi conhecer o famoso bairro habitado por negros e latinos.
Penetrei uns 300 metros. Aqui e ali estavam parados carros da polícia. O grande número indicava perigo. Negros enormes consertavam, nas ruas, os seus Cadillacs. Uma mulher negra costurava roupas numa máquina portátil sentada no batente da porta de sua casa que ameaçava desmoronar. Vi muitas casas e apartamentos sem portas ou janelas, bem como imóveis incendiados. Aquilo era uma horrível favela sem paralelo no Rio de Janeiro. O ambiente metia medo a uma hiena. Lembrei-me dos conselhos do meu avô sertanejo e bati em retirada.
Outro dia resolvi visitar o túmulo do lendário general GRANT, herói da Guerra de Secessão e presidente dos EE. UU..
Situava-se no topo de uma colina isolada, deserta, à margem do HARLEM. O túmulo simples, modesto, sem pompa, como é usual nesse país.
Permaneci ali alguns minutos. E mentalmente recordei a história daquela estúpida guerra do norte contra o sul; irmãos matando irmãos. E ali, naquela sepultura abandonada e silenciosa estavam os restos mortais do vencedor.
Temendo assalto, desci a colina e voltei para o hotel.
Em outro dia me decidi a percorrer a “Broadway”, a rua mais comprida de Nova York, segundo o guia.
Saí do hotel às sete horas de manhã de sol em direção ao norte da ilha de “ Manhatman”, coração de Nova York.
Atingi o início da famosa artéria e iniciei a caminhada. No trajeto eu ia descobrindo igrejas antigas e monumentos suntuosos. Eu parava para admirá-los. A rua é tortuosa e coleia como uma serpente. Eu perdia o rumo e tinha dificuldade, às vezes, para reencontrá-la.
Após percorrer uns oitos ou dez quilômetros cheguei a um edifício gasto pelo tempo, de 30 andares.
Aproximei-me por curiosidade. Uma placa informava ser esse “arranha-céu” o primeiro construído nos EE. UU.. Mais adiante deparei-me com um cemitério de mais de 200 anos onde estavam enterrados vultos da história do país, inclusive Hamilton.
Entrei na MACY’s, a maior loja de departamentos do mundo.
A minha jornada prosseguia, após uma ligeira parada para uma refeição. A noite se aproximava para substituir o dia quando cheguei ao fim da rua mais famosa
da cidade. Tinha caminhado 18 quilômetros. Estava cansado. As pernas doíam. O corpo pedia uma cama macia. Resolvi voltar de metrô. Entrei na estação mais próxima. Havia três linhas superpostas. Na dúvida, perguntei a uma negra gorda sentada no chão em companhia de crianças qual linha eu deveria tomar para descer na estação 46. Não entendi a resposta falada numa espécie de dialeto da raça negra americana. Passava um senhor a quem interpelei. Disse: “siga-me”.  E deu certo.
 Cheguei ao hotel em estado lastimável. Dormi umas 15 horas.
Outro dia resolvi conhecer a maior livraria do mundo. Permaneci no seu interior, admirando livros fantásticos, umas quatro horas. A fome chegou e eu resolvi sair daquela pirâmide. As prateleiras ocupavam vários andares do sub-solo. Eu não sabia em que andar me encontrava e evitava perguntar. Já em estado de desespero dirigi-me a um funcionário que portava no peito esbelto, um enorme crachá. O rapaz me conduziu a um elevador, apertou um botão e eis-me na rua novamente, aliviado.
Uma das minhas últimas “adventures” em Nova York consistiu em subir o “Empire States” e o “Word Trade Center”, este o segundo mais alto edifício do mundo: 110 andares. Lá do topo vê-se os automóveis pequenos como baratas.
Eu não desejava voltar ao Brasil sem visitar a capital americana- Washington. Fui lá em excursão de ônibus.
Hospedei-me num hotel de 2.000 apartamentos; grande como o Coliseu. Claro que eu me perdia no seu recinto. 
Visitei a fazenda do primeiro presidente americano onde está a sepultura do casal. A residência é museu. A cidade é linda. As largas avenidas arborizadas com cerejeiras que estavam floridas.
Diferentemente de Nova York a numeração das artérias de Washington é complexa. O transeunte alienígena pode se perder mesmo que carregue uma bússola.
Estive no museu espacial, o maior do mundo.
Os monumentos colossais, especialmente o de Lincoln.
Visitei o Congresso. Tive dó dos deputados e senadores norte-americanos pela simplicidade dos móveis e outras instalações. Mentalmente fiz comparação com o brasileiro e pensei: parece que o país mais rico do mundo é o Brasil! E me senti orgulhoso da minha pátria.
Viajamos para o interior da Virgínia a fim de visitarmos uma gruta colossal, cuja descrição daria um livro.
Finalmente, visitei o fantástico museu de cera da cidade.
Após quatro dias de emoções indescritíveis, o grupo de turistas voltou a Nova York.
No dia seguinte, ao meio-dia, um homem gritava: “Kombi para o aeroporto Kennedy; cinco dólares”. Nevava muito. O meu avião decolaria às 22 horas. Fazia tanto frio que até PINGUIN reclamaria.
 Temendo uma tempestade, apanhei a mala e entrei no veículo.
O avião da Varig decolou no horário previsto.
Resfolegado na confortável poltrona tomei uma dose de whisky e, aliviado, suspirei profundamente.
Voltava ao meu país!


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