PALESTRA
Exmo.
Senhor Doutor
JOSÉ ANDERSON NASCIMENTO, presidente desta
Academia
Exmas.
Senhoras Acadêmicas
Exmos.
Senhores Acadêmicos
Senhoras
e senhores que, com as suas presenças prestigiam esta solenidade.
Preliminarmente, apraz-me agradecer ao
Exmo. Senhor Presidente desta Casa de Cultura, a oportunidade e a confiança que
me oferece, no sentido de abordar o difícil mas agradável tema que se refere a
alguns dos mais eminentes poetas da culta França, esse país que considero a
minha segunda pátria.
Sou apaixonado pela história da Gália e,
principalmente, pelos seus poetas e seus escritores.
Os deuses concederam a esse belo país o
privilégio de ser o celeiro da poesia universal.
Como Auditor de uma Trading-Company do
Banco do Brasil tive a alegria de trabalhar durante um mês no país de Victor
Hugo.
Em minha minibiblioteca dormitam as obras
de uns 400 poetas franceses.
Proponho-me a apreciar alguns dos mais
sublimes nomes da poesia francesa, e não de suas obras poéticas. Evito traduzir
poemas em obediência a um ditado italiano que diz: Tradutor, traidor.
Ademais, o Filósofo Voltaire sentenciava:
poesia não se traduz, ou se lê no original ou não se lê.
Segundo os críticos, Victor Hugo foi o
mais importante poeta francês, seguido de Lamartine. Ambos, também, notáveis
romancistas.
Victor Hugo nasceu em Besançon, em 1802;
morreu em Paris, em 1885. O seu pai era General do exército de Napoleão.
A vida do poeta foi uma epopeia. Desde
jovem, percorreu com seu pai, a Córsega, a Itália, a Espanha. Na idade madura
foi exilado por Napoleão III. Passa muitos anos a se lamentar sobre o rochedo
de Guernescy. Idoso, regressou à pátria assolada pelos prussianos para tomar
parte no Governo Provisório, e para tornar-se o ídolo da Nação.
A sua atividade ardente espalhou-se em
todas as direções. Coube a ele conduzir o assalto do romantismo contra o
classicismo degenerado.
Quase sozinho, rejuvenesceu, enriqueceu,
renovou o idioma francês.
Dizia ele: “Coloquei um gorro vermelho no
velho dicionário”.
Pondo de lado os seus dramas e seus
romances, foi ele quem, também sozinho, revigorou a técnica dos versos
alexandrinos, monótonos, por longo tempo, e tornar-se um instrumento capaz de
restituir todos os sons e todas as nuanças da expressão poética.
Dois acontecimentos exerceram influência
capital sobre a obra do poeta. Em primeiro lugar a perda de sua filha
Leopoldina, afogada com o seu jovem marido quando de um passeio de barca, em
1843. O mais belo poema de sua obra “Les Contemplations”, jorrou da dor
inconsolável que lhe causou essa terrível prova. Depois, o seu exílio, razão
por que ele lança este grito de ódio, “Les Châtiments”.
É preciso remontar a Juvenal para
encontrar uma tal força dentro da sátira.
Nem tudo é perfeito na obra de Hugo; longe
disso. Muitas vezes falta gosto. Ele cai
na retórica e no lugar comum; deixa-se embriagar pelas palavras e se
transportar até a ênfase; por vezes até ao absurdo. Possui ideias fixas que se
exageram até à mania. Mas, apesar destas restrições, ele continua o maior dos
poetas líricos franceses. Jamais ninguém o suplantou no domínio da palavra, do
ritmo e da rima.
O seu enterro no cemitério “Père Lachaise”,
foi acompanhado por meio milhão de seus admiradores.
ALPHONSE
DE LAMARTINE
Um
dos astros mais brilhantes da poesia francesa.
Nasceu em 1790, de uma família de fidalgos,
proprietários rurais.
Morreu em Passy, em 1869.
A publicação de suas “Meditations”, em
1820, marca o início de uma era memorável da literatura francesa, ao despertar
da poesia lírica francesa que dormitava desde dois séculos, e que se acreditava
morta.
Lamartine, surgindo em tal momento, não
teve predecessor imediato; nenhuma linguagem poética lhe foi imposta. As únicas
influências que sofreu foram aquelas de prosadores como Bernardin de Saint-Pierre
e Chateaubriand.
Assim, nenhuma convenção em sua arte de
uma linguagem abundante, porém simples.
Alguém se arriscará em dizer que ele foi
um amador..., mas que amador!
Passo a me referir ao grande Jean de la
Fontaine.
JEAN
DE LA FONTAINE
Famoso autor de fábulas e de contos
versificados e rimados. No seu tempo, a crítica o chamava de Homero francês, o
que me parece ser uma impropriedade, pois não é válida a comparação de um poeta
épico, Homero (pai da literatura) com um fabulista. Da mesma forma, comparar-se
um romancista com um poeta.
Acredito que coisas
diferentes, opostas, não devem ser comparadas.
La Fontaine nasceu na Champagne, no ano de
1621. Morreu em Paris, em 1695. Viveu 74 anos. De humor fácil e alegre,
encantava seus contemporâneos, tanto pelos seus defeitos como pelas suas
qualidades.
O seu epitáfio, de sua própria autoria, o
pinta ao natural:
“Jean se foi como veio.
Poupava o capital e a renda.
Guardava
seus tesouros, coisa pouco necessária.
Soube
dividir o seu tempo, em duas partes que desejava viver:
Uma
dormindo, a outra sem nada a fazer”.
As suas fábulas são plenas de sabedoria,
fantasia e ironia.
ALFRED DE MUSSET –
Outra estrela de primeira grandeza a brilhar no firmamento da poesia francesa.
O grande poeta nasceu em Paris, em 1810, e
morreu em 1857, aos 47 anos de idade.
Possuo a sua obra completa; 510 páginas. É
lastimável a sua morte, ainda no verdor dos anos, cobrindo de luto a poesia
universal.
Era de natureza tímida e entusiasta, e
evitava ser torturado, ou seja, sofrer.
Era livre-pensador. Sempre inquieto,
sempre em luta contra si mesmo. Ressentia-se da necessidade de crer.
Ainda mais: ele foi um grande poeta
lírico. Como autor de comédias e de provérbios criou, ademais, um gênero
dramático de uma originalidade delicada e profunda.
São cerca de 500 os principais nomes da
poesia francesa. Faço, aqui, uma seleção arbitrária, pois me é impossível e
impraticável abordar a vida de todos eles.
FÉLIX
ARVERS
O poeta nasceu em 1806 e morreu em 1851,
aos 45 anos de idade. Da sua obra poética salvou-se
apenas
um soneto, que foi suficiente para lhe assegurar a imortalidade.
Ainda hoje, esse soneto de amor é
incomparável. Leio-o repetidas vezes.
Não sou invejoso. Contudo, confesso que
fui atingido pelo raio da inveja, e aconteceu o que passo a relatar.
Num certo dia, no consultório da minha
médica, percebi duas belas jovens desconhecidas; uma delas me fez lembrar o
soneto de ARVERS.
De regresso ao lar, surgiu-me uma súbita
inspiração que me determinava compor um poema do mesmo tema: AMOR, coisa rara
na minha obra poética.
Logo veio o título: POEMA PARA UMA
DESCONHECIDA.
Como se o próprio ARVERS estivesse
presente, os versos foram fluindo como flui a água da fonte ao sopé da
montanha.
Em poucos minutos estavam prontos 27
versos. Creio que este poema é o que os franceses chamam de “CHEF-d´oeuvre”.
Este foi o meu maior desafio, desde que
tomei a ousadia de compor versos.
São tantos os notáveis poetas franceses
que tenho dificuldade na escolha.
Agora, desejo prestar homenagem ao maior
poeta francês da Idade Média.
FRANÇOIS
VILLON
Nasceu
em Paris, provavelmente em 1431. O seu verdadeiro nome nos é desconhecido.
Talvez fosse MONTCORBIER. Como fora da lei, quase foi enforcado.
Foi salvo por causa da sua poesia. O nome
VILLON foi tirado de um seu benfeitor, um digno eclesiástico que se interessou
pelo seu talento e cuidou de sua educação.
Essa época era muito perturbada. A guerra
dos Cem Anos tudo arruinou. A universidade fechada frequentemente, durante
muitos meses, e o jovem poeta em lugar de se instruir, frequentava as tabernas.
Inculpado por assassinato, foi condenado à morte. Condenado ao exílio, não se
sabe o seu destino.
Mais tarde foi encontrado afiliado a um bando
de criminosos. Inclusive, compôs muitas baladas na gíria dos bandidos. A data
de morte é incerta. A sua última aparição relatada no anedotário da época, data
de 1463.
Afinal, um pobre poeta que deixou uma obra
imortal.
O seu livro, “Testamento”, de 180 páginas,
em francês e português, ilumina a minha biblioteca.
Continua a minha dificuldade na escolha do
próximo poeta.
VOLTAIRE
Francois – Marie Arouet, dito Voltaire,
nasceu em Paris, em 1694, morrendo em 1778.
Em seu século, este gênio prodigioso, era
reconhecido um grande poeta. O catálogo dos seus poemas épicos, líricos,
didáticos, satíricos, além de tragédias rimadas e numerosas passagens
versificadas contidas em sua correspondência.
Voltaire, autor de um dicionário de
Filosofia é lido, atualmente, apenas em prosa. É uma pena que somente cinco ou
seis dos seus pequenos poemas, elegantemente compostos, tenham sobrevivido a
essa catástrofe.
MALHERBE
FRANÇOIS DE MALHERBE. O seu nome é
encantador, como são os seus versos.
Nasceu em CAEN em 1555.
Os melhores anos de sua vida passa em
AIX-EN- PROVENCE, sob a proteção do
duque d’ ANGOULÊME. Somente em 1605 chega
à Corte.
Começa a versejar tardiamente. Do dia para
a noite tornou-se ditador literário. Impõe uma disciplina à língua, como também
às rimas, quando, daí em diante, as palavras masculinas deveriam alternar-se
com as femininas. Como também as rimas
entre duas palavras do mesmo grupo gramatical. A frase poética deveria observar
a harmonia, ser razoável, ornada de epítetos. São proscritos os termos de baixo
calão e familiares. Em resumo, a ordem solene, hierárquica dos versos devem ser
semelhantes aos dos governos. O terreno está livre para a tragédia corveliana.
Este autor tinha uma presunção que
atravessava as fronteiras do crível: “As obras comuns duram poucos anos. Porém
o que Malherbe escreve dura para sempre! ”
Isto foi dito num poema
enviado a LUIS XIII.
Malherbe morreu em
1628, aos 73 anos.
Considerando que CORNEILLE foi mencionado
nesta biografia, devo dele me ocupar.
PIERRE
CORNEILLE
O grande poeta francês nasceu em ROUEN, em
1606, e morreu em PARIS, em 1684, aos 78 anos.
Como se sabe, o seu gênio manifestou-se
sobretudo na arte dramática.
Contudo, foi também autor de poemas
líricos vigorosos.
Corneille costumava jogar-se aos pés da
rainha da França para oferecer-lhe os seus famosos dramas poéticos inteiramente
rimados.
ÉMILE
VERHAEREN
ÉMILE VERHAEREN, o maior poeta da
FLANDRES, nasceu em 1855. Estudou na Universidade de LOUVAIN.
Morreu no HAVRE em 1916, durante a triste
época em que a sua pátria permanecia agonizante, sob o tacão do alemão invasor.
VERHAEREN mais do que ninguém contribuiu
para a revolução literária da Bélgica. Resumia e representava a alma do país
natal.
O seu primeiro livro de poesia, “LES
FLAMANDES”.
Foi um sucesso, graças ao interesse que a
sua poesia demonstrava pelas fábricas e os operários. Seguiram-se outros
livros: LES MOINES, LES SOIRS, HEURES CLAIRES.
O seu estilo era pessoal.
O crítico FRANCIS YVON ECELES, ao avaliar
os seus poemas, opinou: “ A sua opulência verbal e o seu extremo visor revelam
um certo acanhamento”.
O certo é que VERHAEREN, foi um bom escritor
francês, embora nascido fora da França, provavelmente pensava em flamengo,
influenciado, seguramente, pelo ambiente flamengo e sua língua que ele conservava
áspera.
As suas obras foram editadas pelo Mercure
de France.
Leio um dos seus mais famosos poemas:
“SOIR D’AUTOMNE”.
Não o traduzi, em obediência ao conselho
de Voltaire: “Poesia não se traduz. Ou se lê no original ou não se lê”.
Ademais, diz um ditado italiano:
“Tradutor, traidor”.
Notei que todos os 35
versos representam metáforas das mais estranhas, como se vê nestes dois versos:
“Nuvens da cor do
mármore,
Voam através de um céu
maluco”.
ANDRÉ
CHÉNIER
André de Chénier, nasceu em 1762, em
Constantinópolis, onde seu pai ocupava o cargo de Cônsul-geral da França. A mãe
Cipriota.
Educado na França, mas viajava muito e
exercia diversos empregos tanto militares como diplomáticos.
Quando iniciou-se a Revolução Francesa,
ele filiou-se ao partido revolucionário moderado.
Em 1794, foi preso por ocasião do Terror,
e guilhotinado.
Os seus poemas manuscritos, somente foram
publicados em 1819.
Chénier foi o traço de
união entre classicismo expirante e a escola romântica que nasceu com
Lamartine.
Para concluir com
brilho esta resumida palestra, recito o que, na minha opinião, é o mais
comovente poema de VICTOR HUGO. Lembro que esta minha tradução, é praticamente literal,
e não uma “recriação”, como de hábito em muitos tradutores, como Machado de
Assis, que “recriou” O CORVO, de Edgar Allan Poe, com estrofes de dez versos,
em vez de oito, como no original.
RELÍGIO
Vinha a sombra; o Sol
tombava, calmo e
terrível.
Hermann disse-me: -
Qual é a tua fé;
Qual é a tua
Bíblia?
Fale. Tu és o teu
próprio gigante?
Se teus versos não são
vãos flocos de espuma,
Se a tua estrofe não
seja um tição fumegante
Sobre, um monte de
cinzas do NADA,
Se tu não és uma alma
tragada pelo
abismo,
Qual é, então o teu
CIBÓRIO e a tua
eucaristia?
Qual é, então a fonte
onde tu
bebes?
Calei-me. Disse ele:
Sonhador que
civiliza,
Por que tu não vais
rezar nas igrejas?
Marchamos para o
interior do bosque.
E eu lhe disse: - Eu rezo. Hermann
disse: - Em qual
templo?
Qual é o celebrante que
a tua alma
contempla,
E o altar que ela reza?
Diante de qual confessor
tu a levas?
A Igreja, é o azul
celeste, digo-o
eu, e quanto ao padre...
Neste momento o céu se
ilumina.
A Lua surge no
horizonte, hóstia enorme;
Tudo se agita, o
pinheiro, o cedro e o olmo,
o lobo, a águia e o
alciã3o;
Eles próprios mostram o
astro domado sobre
a terra escura.
Eu lhe disse: - Curve-se, o próprio
Deus
oficia,
E eis aqui a adoração.
Agradeço, comovido, a atenção do público
presente neste cenáculo, e concluo esta palestra citando o grande tribuno
político português, Vieira de Castro.
“A palavra é o vestido
da ideia, assim como a eloquência
é a toilette elegante do pensamento”.
Edson Valadares
(Candidato ao Prêmio Nobel de Literatura
de 2016)
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