quinta-feira, 18 de agosto de 2016

PALESTRA






                                    PALESTRA

Exmo. Senhor Doutor
 JOSÉ ANDERSON NASCIMENTO, presidente desta Academia
Exmas. Senhoras Acadêmicas
Exmos. Senhores Acadêmicos
Senhoras e senhores que, com as suas presenças prestigiam esta solenidade.
Preliminarmente, apraz-me agradecer ao Exmo. Senhor Presidente desta Casa de Cultura, a oportunidade e a confiança que me oferece, no sentido de abordar o difícil mas agradável tema que se refere a alguns dos mais eminentes poetas da culta França, esse país que considero a minha segunda pátria.
Sou apaixonado pela história da Gália e, principalmente, pelos seus poetas e seus escritores.
Os deuses concederam a esse belo país o privilégio de ser o celeiro da poesia universal.
Como Auditor de uma Trading-Company do Banco do Brasil tive a alegria de trabalhar durante um mês no país de Victor Hugo.
Em minha minibiblioteca dormitam as obras de uns 400 poetas franceses.
Proponho-me a apreciar alguns dos mais sublimes nomes da poesia francesa, e não de suas obras poéticas. Evito traduzir poemas em obediência a um ditado italiano que diz: Tradutor, traidor.
Ademais, o Filósofo Voltaire sentenciava: poesia não se traduz, ou se lê no original ou não se lê.
Segundo os críticos, Victor Hugo foi o mais importante poeta francês, seguido de Lamartine. Ambos, também, notáveis romancistas.
Victor Hugo nasceu em Besançon, em 1802; morreu em Paris, em 1885. O seu pai era General do exército de Napoleão.
A vida do poeta foi uma epopeia. Desde jovem, percorreu com seu pai, a Córsega, a Itália, a Espanha. Na idade madura foi exilado por Napoleão III. Passa muitos anos a se lamentar sobre o rochedo de Guernescy. Idoso, regressou à pátria assolada pelos prussianos para tomar parte no Governo Provisório, e para tornar-se o ídolo da Nação.
A sua atividade ardente espalhou-se em todas as direções. Coube a ele conduzir o assalto do romantismo contra o classicismo degenerado.
Quase sozinho, rejuvenesceu, enriqueceu, renovou o idioma francês.
Dizia ele: “Coloquei um gorro vermelho no velho dicionário”.
Pondo de lado os seus dramas e seus romances, foi ele quem, também sozinho, revigorou a técnica dos versos alexandrinos, monótonos, por longo tempo, e tornar-se um instrumento capaz de restituir todos os sons e todas as nuanças da expressão poética.
Dois acontecimentos exerceram influência capital sobre a obra do poeta. Em primeiro lugar a perda de sua filha Leopoldina, afogada com o seu jovem marido quando de um passeio de barca, em 1843. O mais belo poema de sua obra “Les Contemplations”, jorrou da dor inconsolável que lhe causou essa terrível prova. Depois, o seu exílio, razão por que ele lança este grito de ódio, “Les Châtiments”.
É preciso remontar a Juvenal para encontrar uma tal força dentro da sátira.
Nem tudo é perfeito na obra de Hugo; longe disso.  Muitas vezes falta gosto. Ele cai na retórica e no lugar comum; deixa-se embriagar pelas palavras e se transportar até a ênfase; por vezes até ao absurdo. Possui ideias fixas que se exageram até à mania. Mas, apesar destas restrições, ele continua o maior dos poetas líricos franceses. Jamais ninguém o suplantou no domínio da palavra, do ritmo e da rima.
O seu enterro no cemitério “Père Lachaise”, foi acompanhado por meio milhão de seus admiradores.

ALPHONSE DE LAMARTINE
 Um dos astros mais brilhantes da poesia francesa.
Nasceu em 1790, de uma família de fidalgos, proprietários rurais.
Morreu em Passy, em 1869.
A publicação de suas “Meditations”, em 1820, marca o início de uma era memorável da literatura francesa, ao despertar da poesia lírica francesa que dormitava desde dois séculos, e que se acreditava morta.
Lamartine, surgindo em tal momento, não teve predecessor imediato; nenhuma linguagem poética lhe foi imposta. As únicas influências que sofreu foram aquelas de prosadores como Bernardin de Saint-Pierre e Chateaubriand.
Assim, nenhuma convenção em sua arte de uma linguagem abundante, porém simples.
Alguém se arriscará em dizer que ele foi um amador..., mas que amador!
Passo a me referir ao grande Jean de la Fontaine.
JEAN DE LA FONTAINE 
Famoso autor de fábulas e de contos versificados e rimados. No seu tempo, a crítica o chamava de Homero francês, o que me parece ser uma impropriedade, pois não é válida a comparação de um poeta épico, Homero (pai da literatura) com um fabulista. Da mesma forma, comparar-se um romancista com um poeta.
                   Acredito que coisas diferentes, opostas, não devem ser comparadas.
La Fontaine nasceu na Champagne, no ano de 1621. Morreu em Paris, em 1695. Viveu 74 anos. De humor fácil e alegre, encantava seus contemporâneos, tanto pelos seus defeitos como pelas suas qualidades.
O seu epitáfio, de sua própria autoria, o pinta ao natural:
“Jean se foi como veio.
Poupava o capital e a renda.
Guardava seus tesouros, coisa pouco      necessária.
Soube dividir o seu tempo, em duas partes que desejava viver:
 Uma dormindo, a outra sem nada a fazer”.

As suas fábulas são plenas de sabedoria, fantasia e ironia.

ALFRED DE MUSSET – Outra estrela de primeira grandeza a brilhar no firmamento da poesia francesa.
O grande poeta nasceu em Paris, em 1810, e morreu em 1857, aos 47 anos de idade.
Possuo a sua obra completa; 510 páginas. É lastimável a sua morte, ainda no verdor dos anos, cobrindo de luto a poesia universal.
Era de natureza tímida e entusiasta, e evitava ser torturado, ou seja, sofrer.
Era livre-pensador. Sempre inquieto, sempre em luta contra si mesmo. Ressentia-se da necessidade de crer.
Ainda mais: ele foi um grande poeta lírico. Como autor de comédias e de provérbios criou, ademais, um gênero dramático de uma originalidade delicada e profunda.
São cerca de 500 os principais nomes da poesia francesa. Faço, aqui, uma seleção arbitrária, pois me é impossível e impraticável abordar a vida de todos eles.

FÉLIX ARVERS
O poeta nasceu em 1806 e morreu em 1851, aos 45 anos de idade. Da sua obra poética salvou-se


apenas um soneto, que foi suficiente para lhe assegurar a imortalidade.
Ainda hoje, esse soneto de amor é incomparável. Leio-o repetidas vezes.
Não sou invejoso. Contudo, confesso que fui atingido pelo raio da inveja, e aconteceu o que passo a relatar.
Num certo dia, no consultório da minha médica, percebi duas belas jovens desconhecidas; uma delas me fez lembrar o soneto de ARVERS.
De regresso ao lar, surgiu-me uma súbita inspiração que me determinava compor um poema do mesmo tema: AMOR, coisa rara na minha obra poética.
Logo veio o título: POEMA PARA UMA DESCONHECIDA.
Como se o próprio ARVERS estivesse presente, os versos foram fluindo como flui a água da fonte ao sopé da montanha.
Em poucos minutos estavam prontos 27 versos. Creio que este poema é o que os franceses chamam de “CHEF-d´oeuvre”.
Este foi o meu maior desafio, desde que tomei a ousadia de compor versos.
São tantos os notáveis poetas franceses que tenho dificuldade na escolha.
Agora, desejo prestar homenagem ao maior poeta francês da Idade Média.


FRANÇOIS VILLON
 Nasceu em Paris, provavelmente em 1431. O seu verdadeiro nome nos é desconhecido. Talvez fosse MONTCORBIER. Como fora da lei, quase foi enforcado.
Foi salvo por causa da sua poesia. O nome VILLON foi tirado de um seu benfeitor, um digno eclesiástico que se interessou pelo seu talento e cuidou de sua educação.
Essa época era muito perturbada. A guerra dos Cem Anos tudo arruinou. A universidade fechada frequentemente, durante muitos meses, e o jovem poeta em lugar de se instruir, frequentava as tabernas. Inculpado por assassinato, foi condenado à morte. Condenado ao exílio, não se sabe o seu destino.
Mais tarde foi encontrado afiliado a um bando de criminosos. Inclusive, compôs muitas baladas na gíria dos bandidos. A data de morte é incerta. A sua última aparição relatada no anedotário da época, data de 1463.
Afinal, um pobre poeta que deixou uma obra imortal.
O seu livro, “Testamento”, de 180 páginas, em francês e português, ilumina a minha biblioteca.
Continua a minha dificuldade na escolha do próximo poeta.

VOLTAIRE
Francois – Marie Arouet, dito Voltaire, nasceu em Paris, em 1694, morrendo em 1778.
Em seu século, este gênio prodigioso, era reconhecido um grande poeta. O catálogo dos seus poemas épicos, líricos, didáticos, satíricos, além de tragédias rimadas e numerosas passagens versificadas contidas em sua correspondência.
Voltaire, autor de um dicionário de Filosofia é lido, atualmente, apenas em prosa. É uma pena que somente cinco ou seis dos seus pequenos poemas, elegantemente compostos, tenham sobrevivido a essa catástrofe.
MALHERBE
FRANÇOIS DE MALHERBE. O seu nome é encantador, como são os seus versos.
Nasceu em CAEN em 1555.
Os melhores anos de sua vida passa em AIX-EN- PROVENCE, sob     a        proteção           do     duque               d’ ANGOULÊME. Somente em 1605 chega à Corte.
Começa a versejar tardiamente. Do dia para a noite tornou-se ditador literário. Impõe uma disciplina à língua, como também às rimas, quando, daí em diante, as palavras masculinas deveriam alternar-se com as femininas.  Como também as rimas entre duas palavras do mesmo grupo gramatical. A frase poética deveria observar a harmonia, ser razoável, ornada de epítetos. São proscritos os termos de baixo calão e familiares. Em resumo, a ordem solene, hierárquica dos versos devem ser semelhantes aos dos governos. O terreno está livre para a tragédia corveliana.
Este autor tinha uma presunção que atravessava as fronteiras do crível: “As obras comuns duram poucos anos. Porém o que Malherbe escreve dura para sempre! ”
Isto foi dito num poema enviado a LUIS XIII.
Malherbe morreu em 1628, aos 73 anos.
Considerando que CORNEILLE foi mencionado nesta biografia, devo dele me ocupar.

PIERRE CORNEILLE
O grande poeta francês nasceu em ROUEN, em 1606, e morreu em PARIS, em 1684, aos 78 anos.
Como se sabe, o seu gênio manifestou-se sobretudo na arte dramática.
Contudo, foi também autor de poemas líricos vigorosos.
Corneille costumava jogar-se aos pés da rainha da França para oferecer-lhe os seus famosos dramas poéticos inteiramente rimados.


ÉMILE VERHAEREN
ÉMILE VERHAEREN, o maior poeta da FLANDRES, nasceu em 1855. Estudou na Universidade de LOUVAIN.
Morreu no HAVRE em 1916, durante a triste época em que a sua pátria permanecia agonizante, sob o tacão do alemão invasor.
VERHAEREN mais do que ninguém contribuiu para a revolução literária da Bélgica. Resumia e representava a alma do país natal.
O seu primeiro livro de poesia, “LES FLAMANDES”.
Foi um sucesso, graças ao interesse que a sua poesia demonstrava pelas fábricas e os operários. Seguiram-se outros livros: LES MOINES, LES SOIRS, HEURES CLAIRES.
O seu estilo era pessoal.
O crítico FRANCIS YVON ECELES, ao avaliar os seus poemas, opinou: “ A sua opulência verbal e o seu extremo visor revelam um certo acanhamento”.
O certo é que VERHAEREN, foi um bom escritor francês, embora nascido fora da França, provavelmente pensava em flamengo, influenciado, seguramente, pelo ambiente flamengo e sua língua que ele conservava áspera.
As suas obras foram editadas pelo Mercure de France.
Leio um dos seus mais famosos poemas: “SOIR D’AUTOMNE”.
Não o traduzi, em obediência ao conselho de Voltaire: “Poesia não se traduz. Ou se lê no original ou não se lê”.
Ademais, diz um ditado italiano: “Tradutor, traidor”.
Notei que todos os 35 versos representam metáforas das mais estranhas, como se vê nestes dois versos:
“Nuvens da cor do mármore,
Voam através de um céu maluco”.



ANDRÉ CHÉNIER
André de Chénier, nasceu em 1762, em Constantinópolis, onde seu pai ocupava o cargo de Cônsul-geral da França. A mãe Cipriota.
Educado na França, mas viajava muito e exercia diversos empregos tanto militares como diplomáticos.
Quando iniciou-se a Revolução Francesa, ele filiou-se ao partido revolucionário moderado.
Em 1794, foi preso por ocasião do Terror, e guilhotinado.
Os seus poemas manuscritos, somente foram publicados em 1819.
Chénier foi o traço de união entre classicismo expirante e a escola romântica que nasceu com Lamartine.
Para concluir com brilho esta resumida palestra, recito o que, na minha opinião, é o mais comovente poema de VICTOR HUGO. Lembro que esta minha tradução, é praticamente literal, e não uma “recriação”, como de hábito em muitos tradutores, como Machado de Assis, que “recriou” O CORVO, de Edgar Allan Poe, com estrofes de dez versos, em vez de oito, como no original.





RELÍGIO

Vinha a sombra; o Sol tombava, calmo e
                                                    terrível.
Hermann disse-me: ­­­- Qual é a tua fé;
                              Qual é a tua Bíblia?
Fale. Tu és o teu próprio gigante?
Se teus versos não são vãos flocos de espuma,
Se a tua estrofe não seja um tição fumegante
Sobre, um monte de cinzas do NADA,
Se tu não és uma alma tragada pelo
                                               abismo,
Qual é, então o teu CIBÓRIO e a tua
                                        eucaristia?
Qual é, então a fonte onde tu
                                   bebes?
Calei-me. Disse ele: Sonhador que
                                            civiliza,
Por que tu não vais rezar nas igrejas?
Marchamos para o interior do bosque.
E eu lhe disse:  - Eu rezo. Hermann
disse: - Em qual templo?
Qual é o celebrante que a tua alma
                                       contempla,
E o altar que ela reza?
Diante de qual confessor tu a levas?
A Igreja, é o azul celeste, digo-o
               eu, e quanto ao padre...
Neste momento o céu se ilumina.
A Lua surge no horizonte, hóstia enorme;
Tudo se agita, o pinheiro, o cedro e o olmo,
o lobo, a águia e o alciã3o;
Eles próprios mostram o astro domado sobre
                                                a terra escura.



Eu lhe disse: - Curve-se, o próprio
                                     Deus oficia,
E eis aqui a adoração.

Agradeço, comovido, a atenção do público presente neste cenáculo, e concluo esta palestra citando o grande tribuno político português, Vieira de Castro.

“A palavra é o vestido
da ideia, assim como a eloquência
                 é a toilette elegante do pensamento”.

            Edson Valadares
(Candidato ao Prêmio Nobel de Literatura de 2016)


                                                  

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